segunda-feira, 20 de setembro de 2010

CENSO IBGE 2010: Indicadores questionáveis sobre pessoas com deficiência

Wiliam César Alves Machado faz relato sobre a visita de um recenseador em sua residência e sobre o método de questionário
Wiliam César Alves Machado

Na última quinta-feira, 19 de agosto de 2010, recebi em casa o recenseador do IBGE/Censo 2010, após iniciativa de agendar pelo telefone sua visita, cheio de expectativas para passar dados específicos da minha condição de pessoa com deficiência física adquirida e suas particularidades. Qual surpreso fiquei ao constatar que existem duas modalidades de formulários, um menos abrangente e sem espaço para registros sobre deficiência, outro com mais detalhamentos e que contempla tais informações, porém, ambos dependentes do fluxo do sistema para serem ou não acionados.
Na ocasião, segundo me informou a recenseadora, o sistema abriu exato o modelo simplificado, o que implicou na impossibilidade de passar informações acerca de questões singulares de cidadão com deficiência, mas imprescindíveis para servir de parâmetro na elaboração, ainda que aproximada, do que se pretende como nossa imagem e representação social. Em face disso questiono: Como se pode inferir numericamente percentuais relativos a complexidade que envolve o estar deficiente físico, auditivo, mental, visual e pessoa com deficiência múltipla, sem a captação precisa de registros objetivos nos formulários aplicados nas residências visitadas? O que custaria incluir em todos os formulários a categoria existência de ente familiar com deficiência e tipo, afinal, não representamos cerca de 14,5% da população? Como planejar o implemento de políticas públicas focadas na saúde, educação, acessibilidade, trabalho e lazer desse segmento da sociedade, desguarnecidos de seus indicadores objetivos?
Em primeiro lugar, há que se considerar as inferências resultantes de metodologias quantitativas aplicadas em estudos e pesquisas na área social como categorias amostrais que servem para explicar tendências do geral, porém, pelo seu caráter essencialmente numérico cerceiam a possibilidade do emergir dos detalhes, inerentes à multiplicidade de elementos constitutivos da abordagem qualitativa, interpretativa por excelência. Aliás, são os detalhes que fazem a diferença na elaboração da imagem representativa de alguns fenômenos sociais, entre os quais a deficiência como condição de vida na espécie humana. Sem dados objetivos referentes aos tipos de deficiência identificados em cada residência visitada pelos agentes do Censo IBGE 2010, o planejamento, implementação e avaliação de políticas públicas em âmbito intersetorial para dar conta do atendimento das necessidades das pessoas com deficiência fica sobremaneira comprometido, perpetuando a falta de objetividade das ações e o descompromisso do setor público para com esse segmento da sociedade.
Por outro lado, são absolutamente incompreensíveis as razões alegadas pela equipe técnica responsável pela elaboração dos instrumentos para coleta de dados do Censo IBGE 2010, em termos da não inclusão de simples questão para identificar pessoa com deficiência na composição familiar das residências brasileiras. Um sim ou não e tipo da deficiência bastariam para suprir a lacuna, até porque, indicadores de gênero, cor da pele, idade, escolaridade, renda mensal, entre outros caracteres sóciodemográficos estão subjacentes ou claros em ambos os formulários. Então, por que não se obter dados mais precisos de 14,5% da população, constituída por pessoas com necessidades específicas no campo da saúde, educação, trabalho, lazer, etc.? Até quando passaremos por invisíveis quando da elaboração de instrumentos para avaliação do que se refere a nós mesmos? Onde fica o jargão nada sobre nós sem nós?
Agora resta aguardar para vermos o resultado do Censo 2010. A única certeza que temos é de que teremos uma planilha simbólica de dados subjetivos que não representam a realidade e contextos das pessoas com deficiência na sociedade brasileira, a qual teremos de arquitetar estratégias imaginárias para dar conta da face concreta da realidade dessas pessoas. Tarefa difícil essa, hein! Arregacemos as mangas, um imenso desafio se anuncia.

Wiliam César Alves Machado é Secretário Municipal do Idoso e da PcD de Três Rios, Rio de Janeiro.

http://www.saci.org.br/index.php?modulo=akemi&parametro=29838

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